Cremos poder dizer, sem arriscar mentir, que a tarefa mais difícil relacionada com este blogue foi a escolha do título que lhe dá nome… Foram horas de sugestões e discussão, até que concordámos que Atlântico de Histórias se coadunava perfeitamente com a leitura que fizemos do concurso e com aquilo que decidimos criar e transmitir.
Sendo o tema deste ano os 800 anos da Língua Portuguesa, sabíamos de antemão que muitas histórias estariam presentes. Mas cientes de que a Língua Portuguesa se fez ao mundo através do oceano Atlântico, decidimos que fazia todo sentido referi-lo. Daí que tenhamos escolhido “Atlântico de Histórias”, porque histórias escritas em Português surgem em muitas costas diferentes banhadas pelo Atlântico.
Mas se foi através desse que a Língua Portuguesa primeiro chegou a outras costas, é também a sua travessia que permite a autores de outras línguas chegarem a Portugal. Hoje deliberámos falar não de autores portugueses, mas de três autores norte-americanos que escolheram viver em Portugal. Todos eles escrevem em Inglês, todavia já é possível ler, pelo menos um, em Português, pois as suas obras são encontram-se traduzidas e constituem um sucesso de vendas.
“Vivi, olhei, li, senti, Que faz aí o ler, Lendo, fica-se a saber quase tudo, Eu também leio, Algo portanto saberás, Agora já não estou certa, Terás então de ler doutra maneira, Como, Não serve a mesma para todos, cada um inventa a sua, a que lhe for própria, há quem leve a vida inteira a ler sem nunca ter conseguido ir mais além da leitura, ficam pegados às página, não percebem que as palavras são apenas pedras postas a atravessar a corrente de um rio, se estão ali é para que possamos chegar à outra margem, a outra margem é que importa, A não ser, A não ser, quê, A não ser que esses tais rios não tenham duas margens, mas muitas, que cada pessoa que lê seja, ele, a sua própria margem, que seja sua, e apenas sua, a margem a que terá que chegar…”
in A Caverna, José Saramago
Somos margens. Somos leitoras ávidas. Somos “ratos de biblioteca”. Amamos os livros e a leitura. Inventamos a cada dia novas formas de ler. E os livros surgem, naturalmente, nas nossas conversas…
O que são expressões idiomáticas? Para que servem e de onde surgiram?
"Podemos definir expressão idiomática como uma locução ou modo de dizer privativo de uma determinada língua e que não é possível traduzir literalmente em outras línguas. Também é denominada idiotismo, palavra de origem grega e que passou para o latim como idiotismu – e deste para as línguas neolatinas.
As expressões idiomáticas são manifestações espontâneas da criatividade, do humor e da beleza de qualquer língua. Não é possível, portanto, determinar a sua origem, pois fazem parte da essência da comunicação verbal.
As expressões idiomáticas não têm uma utilidade específica, mas criam imagens que captam a emoção e a sensibilidade dos falantes, podendo ainda facilitar a memorização."
in http://ciberduvidas.pt/pergunta.php?id=12855
Inspiradas por alguns posts deste blog (do qual retirámos algumas das imagens), resolvemos também nós ilustrar algumas expressões idiomáticas da nossa língua e explicar o seu significado. Esses posts podem ser consultados aqui.
(Pintura de Jay Fancher)
E como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa,
e no fecho da tarde um sino rouco
se misturasse ao som de meus sapatos
que era pausado e seco; e aves pairassem
no céu de chumbo, e suas formas pretas
lentamente se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes
e de meu próprio ser desenganado,
a máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava
e só de o ter pensado se carpia.
Abriu-se majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro
nem um clarão maior que o tolerável
pelas pupilas gastas na inspeção
contínua e dolorosa do deserto,
e pela mente exausta de mentar
toda uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada
no rosto do mistério, nos abismos.
Abriu-se em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam
a quem de os ter usado os já perdera
e nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos
os mesmos sem roteiro tristes périplos,
convidando-os a todos, em coorte,
a se aplicarem sobre o pasto inédito
da natureza mítica das coisas,
assim me disse, embora voz alguma
ou sopro ou eco ou simples percussão
atestasse que alguém, sobre a montanha,
a outro alguém, noturno e miserável,
em colóquio se estava dirigindo:
"O que procuraste em ti ou fora de
teu ser restrito e nunca se mostrou,
mesmo afetando dar-se ou se rendendo,
e a cada instante mais se retraindo,
olha, repara, ausculta: essa riqueza
sobrante a toda pérola, essa ciência
sublime e formidável, mas hermética,
essa total explicação da vida,
esse nexo primeiro e singular,
que nem concebes mais, pois tão esquivo
se revelou ante a pesquisa ardente
em que te consumiste... vê, contempla,
abre teu peito para agasalhá-lo.”
As mais soberbas pontes e edifícios,
o que nas oficinas se elabora,
o que pensado foi e logo atinge
distância superior ao pensamento,
os recursos da terra dominados,
e as paixões e os impulsos e os tormentos
e tudo que define o ser terrestre
ou se prolonga até nos animais
e chega às plantas para se embeber
no sono rancoroso dos minérios,
dá volta ao mundo e torna a se engolfar,
na estranha ordem geométrica de tudo,
e o absurdo original e seus enigmas,
suas verdades altas mais que todos
monumentos erguidos à verdade:
e a memória dos deuses, e o solene
sentimento de morte, que floresce
no caule da existência mais gloriosa,
tudo se apresentou nesse relance
e me chamou para seu reino augusto,
afinal submetido à vista humana.
Mas, como eu relutasse em responder
a tal apelo assim maravilhoso,
pois a fé se abrandara, e mesmo o anseio,
a esperança mais mínima — esse anelo
de ver desvanecida a treva espessa
que entre os raios do sol inda se filtra;
como defuntas crenças convocadas
presto e fremente não se produzissem
a de novo tingir a neutra face
que vou pelos caminhos demonstrando,
e como se outro ser, não mais aquele
habitante de mim há tantos anos,
passasse a comandar minha vontade
que, já de si volúvel, se cerrava
semelhante a essas flores reticentes
em si mesmas abertas e fechadas;
como se um dom tardio já não fora
apetecível, antes despiciendo,
baixei os olhos, incurioso, lasso,
desdenhando colher a coisa oferta
que se abria gratuita a meu engenho.
A treva mais estrita já pousara
sobre a estrada de Minas, pedregosa,
e a máquina do mundo, repelida,
se foi miudamente recompondo,
enquanto eu, avaliando o que perdera,
seguia vagaroso, de mãos pensas.
Não, Poesia:
Não te escondas nas grutas do meu ser,
Não fujas à Vida.
Quebra as grades invisíveis da minha prisão,
Abre de par em par as portas do meu ser
- sai…
Sai para a luta (a vida é luta)
Os homens lá fora chamam por ti,
E tu, Poesia és também um Homem.
Ama as Poesias de todo o Mundo,
- ama os Homens
Solta teus poemas para todas as raças,
Para todas as coisas.
Confunde-te comigo…
Vai, Poesia:
Toma os meus braços para abraçares o Mundo,
Dá-me os teus braços para que abrace a Vida.
A minha Poesia sou eu.
Blogue criado para a participação na segunda edição do concurso Ler Em Português, promovido pela Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, a Rede de Bibliotecas Escolares e o Plano Nacional de Leitura, tendo como tema: Português, Uma Língua com História.
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